SO!LÚ!ÇO!
Começou assim.
Três pontos e um
vazio.
Não se falava nada.
A gente nem sabia o
que perguntar.
Falávamos “coisas
pássaros”, sabe?
Você fala e elas
flutuam, seguem sem rumo, se tornam pássaros.
Solta-se algo no ar
e deixa-se ir, não se tem resposta e nem se sabe porque se
perguntou, são frases livres de qualquer retorno.
Ficamos parados,
frente a frente.
– Faz quanto tempo
que você não morre de saudades de mim?
– Morro?
- Morre?
– Mas… é
preciso morrer?
– Sim.
– Eu não sei.
- Eu sabia.
- Sabia?
- Claro!
- Essas coisas a
gente sente
- Mas eu sinto
saudades
- Tô falando de uma
coisa maior, um arrependimento de não ter ficado, de não ter me
levado, de não ter pensado nisso tudo antes, de ouvir a minha voz,
de sentir o meu cheiro, de olhar a minha foto 3x4 sempre que alguém
não está olhando, de olhar as coisas e lembrar de mim… de desejar
que eu estivesse, de me ligar e o coração acelerar, de se preparar
para nosso reencontro.
- Você sente tudo
isso?
- Já senti.
- Desse jeito?
- Muda um pouco de
caso a caso.
- Você já sentiu
isso muitas vezes?
- Algumas.
- Por mim?
- Também.
- Você já sentiu
isso por muita gente?
- Por umas três
pessoas.
- E eu sou uma
delas?
- Já disse que sim.
- Mas desse jeito
assim?
- Parecido. talvez
as mesmas coisas mas em intensidade diferente.
- Será que eu nunca
senti isso?
- Acho que sim, mas
não por mim.
- Mas porque você
fala isso?
- Porque conheço
muito de você, até o que você quer quando faz a barba e corta o
cabelo.
- Ah e o que é?
- Mudança.
- De quê?
- De qualquer coisa.
- Ninguém tem
necessidade de mudar qualquer coisa.
- Mudar tudo então,
melhorou?
- Melhorou.
- E tudo não pode
ser qualquer coisa já que tudo é tudo?
- Depende do ponto
de vista.
- O meu ponto de
vista agora é que mais uma vez você quer ter razão e isso me
esgota.
- Não, você está
completamente enganada. Eu quero entender o que você está falando.
Se eu pergunto você acha que quero ter razão. Seu eu não pergunto
você acha que estou cagando.
- E não está?
- A gente começou
falando de saudade e agora tá falando de merda, é isso mesmo?
- No final das
contas, saudade é uma merda mesmo. Ainda mais quando a saudade é
daquilo que você não tem mais, mesmo que aquilo esteja na sua
frente, na sua cama, dentro de você.
- Dentro você diz,
sexualmente?
- Também.
- E qual o outro
jeito poderia ser dentro?
- O coração, ou o
meu tá pra fora?
- As vezes quase sai
pela boca.
- Ah claro, devo ser
muito explícita mesmo.
- As vezes sim.
- E isso é bom ou é
ruim?
- Depende do ponto
de vista. Tudo é relativo.
- Meu deus! Estou
trepando com a reencarnação do Eisten e nunca percebi. Só espero
que o pau não caia.
- Trepando? É isso
que você acha que a gente está fazendo quando tô dentro de você?
- Também.
- Explícita.
- Eu gosto de
sacanagem, por isso gostei de você. Foi a maior sacanagem que eu
poderia ter feito comigo mesma.
- Nossa! Eu sou tão
péssimo assim?
- Nunca disse que
sacanagem era ruim.
- Tá vendo? Ponto
de vista.
- A gente nunca vai
ter o mesmo ponto de vista nenhuma vez em toda a nossa vida?
- A gente tem as
vezes.
- É, mas parece
soluço, vem e passa. E passa com susto, isso é o mais phoda. Quase
uma pixada de tapete.
- A gente gosta de
vinho.
- É, a gente gosta.
- A gente gosta de
transar.
- Eu de noite, você
de manhã.
- A gente gosta de
música.
- É a gente gosta.
- Você gosta de
dançar.
- E você não.
- Mas eu gosto de te
ver dançar, isso não conta?
- Conta, mas as
vezes eu quero dançar com você. E tudo o que você gosta de fazer
mais na vida é sem mim.
- Nossa, que
exagero.
- Ué? Eu não sou
explícita? Olha… até que não é ruim ser explícita, pensa. Você
é pornográfico.
- Eu?
- É, cê tem uma
capacidade tão grande de foder com tudo que chega a ser
pornográfico.
- O que você tá
fazendo comigo então?
- Meu coração tá
na boca?
- Agora?
- É?
- Quase.
- Você faz eu me
sentir viva. Faz doer a minha cabeça de tanto pensar, faz meu
estômago se retorcer inteiro. Não sei explicar. Fica uma coisa aqui
dentro mexendo.
- Nossa, você me
causa tantas outras coisas.
- É, o que por
exemplo?
- Você sabe, tesão,
amor, saudade, te admiro, gosto do seu cheiro, da sua bunda, dos seus
desenhos, das músicas que você gosta, das cores das suas roupas,
você é o amor da minha vida.
- Fala mais.
- Gosto da sua
comida, até quando você erra alguma coisa fica bom. Gosto de te ver
dormir, acordar, tomar banho, da sua letra, das suas mensagens.
- Sério mesmo tudo
isso?
- Sério.
- Nossa, então,
você tem tudo pra morrer de saudades de mim.
- É, eu tenho. Eu
morro. É que a gente nunca ficou longe muito tempo.
- O que você acha
da gente dar um tempo pra ver se você morre mesmo?
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